Kalunga Mar: com leveza e palhaçaria, Indômita Cia. fala de antirracismo e ancestralidade negra para crianças

Novembro 05, 2025

A Indômita Cia. embarca em uma nova e potente viagem. O espetáculo infantil Kalunga Mar utiliza a leveza e a magia da palhaçaria para navegar em temas profundos como pertencimento, ancestralidade negra, refúgio e deslocamento forçado na infância.” A montagem cumpre temporada com sete apresentações em escolas e em unidades do Centro de Atendimento Unificado (CEU) e duas sessões abertas ao público nos dias 9 de novembro, domingo, às 16h, no Teatro Flávio Império, em Cangaíba, e dia 14 de novembro, sexta-feira, às 15h, no CRAI (Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes), na Bela Vista. A peça conta a história de Ursa Maior, uma palhaça navegante que sobe em sua jangada tecida de curiosidade para buscar a decolonização de si e do mundo. O título evoca Kalunga, palavra banto de origem africana que significa grandeza, imensidão e mar, ressignificando um espaço histórico de dor para o povo negro em um oceano de poesia e possibilidades. A obra, que une comicidade física, música e pitadas de magia, conta com direção de Ronaldo Aguiar, provocações dramatúrgicas de Drica Santos e Nereu Afonso e atuação de Loi Lima, idealizadora do projeto.


Crédito: Ricardo Avellar

O riso como caminho de volta
Para Loi Lima, o diferencial de Kalunga Mar reside na escolha da linguagem. Palhaça há mais de 20 anos e atuando em contextos de vulnerabilidade e refúgio, ela entende o poder terapêutico e político do riso. A artista explica que a palhaçaria desarma, abre o coração e, por isso, é a via perfeita para tratar de questões identitárias cruciais. "Percebemos que para falar de temas tão sensíveis como refúgio, pertencimento e diáspora, o nariz vermelho é o nosso melhor passaporte. A criança ri e, ao rir, ela se permite receber a mensagem de maneira mais leve, sem a pressão do didatismo", afirma Loi. Nas palavras da atriz, o espetáculo tem a missão de fomentar uma "infância negra emancipadora", e o caminho para isso passa pela ressignificação de símbolos, como o próprio mar. Historicamente, a travessia atlântica carrega a dor da escravização. Na peça, este cenário é transformado em um espaço de grandeza e de guia.

Loi detalha esse processo de inversão de significado: "O mar foi o maior cemitério do nosso povo, um túmulo. A Palhaça Ursa Maior navega por esse mar, guiada pelas estrelas, provando que é possível se curar e encontrar um novo caminho. “É uma forma de dizer para as nossas crianças: olhem para o Kalunga Mar, olhem para a sua ancestralidade e saibam que vocês são grandes e capazes de ir além de qualquer barreira. O mar não é o fim; ele é o começo da sua jornada." A palhaça navegante, que toca seu tambor e nos pés utiliza um par de Gungas - instrumento do Moçambique, manifestação afro religiosa sudestina - convida a plateia a fazer a viagem junto, reforçando que não há idade para a jornada de autodescoberta e decolonização. A proposta é nítida: levar a arte do circo e do teatro para o debate antirracista, garantindo que as crianças negras tenham referenciais positivos e que as crianças brancas aprendam sobre o mundo múltiplo de forma empática.

A encenação da diáspora e a força do jogo circense
O diretor Ronaldo Aguiar, especializado em circo e palhaçaria, destacou que o maior desafio de Kalunga Mar foi traduzir as inquietações sobre diáspora e migração forçada para a poética da infância. Aguiar explica que a direção utilizou os códigos clássicos da palhaçaria, como o jogo, a triangulação e a mágica, para construir a cena. "Uma das coisas que sempre fiquei provocando no processo foi como a gente poderia trazer os códigos da palhaçaria e a manipulação de objetos", conta. O poder da imaginação é essencial, permitindo que o palco se transforme no vasto Kalunga Mar. É a partir desse lugar imaginário e poético que a linguagem da palhaçaria nos dá permissão para adentrar nesse território," reflete o diretor.

A peça enfatiza que decolonizar é um ato de resistência e busca por novos caminhos. A Palhaça Ursa Maior interage com o público, convidando-o a participar dessa jornada. Aguiar afirma que a decolonização está ligada a recusar a opressão: "decolonizar também é não aceitar o que o opressor ou os territórios de perigo podem oferecer. E uma das maiores formas de se rebelar é fugir desse lugar de guerra." A Ursa Maior, ao se deparar com a opressão, escolhe seguir em frente, reforçando a ideia de um "corpo decolonizado". "O que ela faz? Ela sempre vai embora quando ela sente que está num processo de opressão. Então, esses lugares também criam esse corpo decolonizado, que é o corpo que resiste, que é o corpo que não vai se permitir a ficar numa narrativa do opressor." Essa tradução das narrativas de resistência para a linguagem da infância foi a grande conquista poética do espetáculo.

Sobre a Indômita Cia
Fundada em 2016 por Loi Lima, a Indômita Cia. tem sua pesquisa voltada às linguagens de circo, teatro e narração de histórias, desenvolvendo um trabalho cênico em diálogo direto com as infâncias negras. A missão da companhia é construir espetáculos infantis que, de forma lúdica, fomentem uma infância negra emancipadora e uma infância branca antirracista, através do fortalecimento de referenciais de negritude e do debate sobre pertencimento e ancestralidade. A Indômita Cia. acredita no poder transformador da arte para criar um mundo "múltiplo e, por isso, lindo", como propõe o espetáculo.

Sobre Loi Lima
Loi Lima é atriz, palhaça e produtora cultural afro caipira com mais de 20 anos dedicados às artes da cena. Fundadora e integrante da Indômita Cia., é a idealizadora do projeto Kalunga Mar e responsável por dar vida à Palhaça Ursa Maior. Seu trabalho se estende para além do palco: desde 2018, integra o elenco do Palhaços sem Fronteira Brasil, atuando em áreas de conflito, refúgio e vulnerabilidade social ao redor do mundo, com projetos no Líbano (para crianças sírias refugiadas), São Paulo, Cataluña e Barcelona. Ministrou junto ao PSF Brasil oficina artística para a equipe do CAMI - Centro de Apoio Pastoral do Migrante. Desde 2022, Loi também integra a Organização Doutores da Alegria como a palhaça besteirologista Dr. Ursa Maior, atualmente no Hospital GRAACC.

Ficha Técnica

Elenco: Loi Lima. Direção: Ronaldo Aguiar. Provocação Dramatúrgica: Drica Santos e Nereu Afonso. Trilha Sonora: Iúna Augusto. Figurino: San Pestana. Cenário e Adereços: Lua Nucci. Preparação Corporal: Deise de Britto. Preparação Vocal: Livia Gold. Assessoria Gungas e Tambor: Renato Ihu. Técnica de Som: Lays Somogyi. Assessoria de Imprensa: Arteplural. Produção: Pin Rolê Invenções. Classificação Indicativa: Livre.

Serviço:

Sessões abertas ao público:

Dia 9 de Novembro (Domingo) - 16:00
Teatro Flávio Império
R. Prof. Alves Pedroso, 600 - Cangaíba, São Paulo – SP
Distribuição de ingressos com 1 hora de antecedência.

Dia 14 de Novembro (Sexta-Feira) - 15:00
CRAI - Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes
R. Maj. Diogo, 834 - Bela Vista, São Paulo – SP
Apresentação integra a programação de aniversário do CRAI.

Fonte: ArtePlural Comunicação

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