Televisão
por Elmo Francfort Ankerkrone
Novembro 23, 2001
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Uma TV no meio da Paulista
 
TV Gazeta, uma TV no meio da Avenida Paulista... Quem conhece São Paulo sabe que um dos seus principais cartões de visita é justamente o prédio onde está localizada todas as empresas, desde rádios, jornais, uma televisão e uma faculdade, pertencentes a Fundação Cásper Líbero. A antena de televisão mais famosa é a da emissora, que também é usada pela Rede Globo em São Paulo. É desta forma que entraremos na década de 70, começando a contar a história da TV Gazeta, canal 11 de São Paulo.
 
Os gazeteiros
 
A história dos gazeteiros nasce no início do século XX, quando o jornalista Cásper Líbero decide comprar o pequeno jornal "A Gazeta", que se localizava na Rua Líbero Badaró. E Cásper também chegou a criar com amigos o vespertino "Última Hora" no Rio de Janeiro (que não tem nada a ver com o jornal homônimo do jornalista Samuel Wainer) e chegou a dirigir a redação de "O Estado de São Paulo". Mas voltando a "A Gazeta", o seu primeiro dono Doutor Covello ficou muito aflito e no ano de 1906 começou a oferecer o jornal para quem quisesse comprar, achava que jornalismo não era seu negócio. E foi assim que naquele mesmo ano, ele vendeu o jornal em 16 de maio ao jovem Cásper Líbero.
 
E aos poucos "A Gazeta" ia crescendo. Cásper chegou a passar apertos para comprar novas máquinas e manter seu jornal. Mudou de sede, indo para um prédio que ocupava os números 624 e 628 da mesma Líbero Badaró - e que até hoje existe.
 
E é esta força de Cásper, de querer que o seu jornal continuasse com o mesmo padrão, que faz o mesmo criar a Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, a primeira faculdade de jornalismo do país.
 
"A Gazeta" começa a se popularizar com a criação de mais um jornal do grupo, "A Gazeta Esportiva", que ficou famosa pela criação da Corrida de São Silvestre em 1925.
 
Em 1932, antes mesmo de estourar a Revolução Constitucionalista em São Paulo, Cásper Líbero resolve apoiar os revolucionários. "A Gazeta" se torna o jornal tido como um dos símbolos do movimento paulista. No meio rádio a principal aliada do povo de São Paulo era a Rádio Record, enquanto no jornalismo vinha "A Gazeta" (por Cásper Líbero acatar fervorosamente o movimento, a "Sociedade Veteranos de 32" colocou seu túmulo na cripta do Mausoléu do Ibirapuera que fica embaixo do famoso obelisco). E a popularidade deste jornal cresce assustadoramente, sendo que depois da revolução ele chegou ao patamar do "Diário de S.Paulo" (dos Diários Associados), de "O Estado de São Paulo" (dos Mesquita) e da "Folha de S.Paulo" (dos Frias).
 
E é nesse tempo de ascensão que o grupo se amplia,sendo que em 3 de novembro de 1939 funda o mais arrojado parque gráfico da época: o "Palácio da Imprensa", que existe até hoje e esta localizado na Avenida Cásper Líbero, próximo a Estação da Luz. Hoje se vê no alto de seu saguão ilustrações sobre a história da imprensa no mundo, a única coisa que restou após se mudarem para o edifício da Avenida Paulista, 900.
 
Os gazeteiros cresceram ainda mais quando compraram em 15 de março de 1943 a Rádio Educadora de São Paulo, a primeira rádio de nossa cidade. E esta se tornou "Rádio Gazeta" (por isto o slogan da mesma é "Gazeta, a primeira"). Neste mesmo mês de março, Cásper começou a fazer seu testamento, temendo que um dia morresse e o seu império fosse totalmente desfeito. Foi neste testamento que diz que seus bens seriam administrados por uma fundação dos próprios gazeteiros e todos os lucros que tivessem a mais do que o necessário para pagar as contas da fundação, seriam revertidos e aplicados para a mesma, somente.
 
Em 1947, num fatídico acidente aéreo morre o jornalista Cásper Líbero. É aberto o testamento. E nasce a Fundação legalmente, sendo que a mesma é batizada com o nome de seu fundador. A partir daí a Fundação Cásper Líbero começa a responder por todas as empresas do grupo e torna-se um dos mais fortes grupos de comunicação da época.
 
Antenados com a criação do meio televisivo no país, três anos depois, a Fundação Cásper Líbero começa a idealizar o sonho de ter uma emissora de TV.
 
Canal 20
 
Com o sonho já amadurecido, na década de 50, a Cásper Líbero entra na concorrência por uma concessão de TV para operar na cidade São Paulo. E é pelas mãos do presidente Juscelino Kubitscheck que eles a ganham em 1959. E a idéia de possuir uma emissora já tinha garantida até mesmo uma sede própria para esta, localizada num casarão antigo no número 900 da Avenida Paulista. Um grande casarão, que com certeza havia sido construído por algum barão do café. E foi bem na frente do mesmo, já na década de 60, que colocaram uma grande placa escrita:"Futuras instalações da TV Gazeta - Canal 11". E os que passavam pela Avenida Paulista já começavam a associar que logo teriam uma nova emissora em São Paulo e que a mesma era pertence a Fundação Cásper Líbero, por receber o mesmo nome dos jornais e da emissora de rádio. A placa ficou uma década ali na frente (literalmente!) enquanto a TV Gazeta estava sendo planejada.
 
No ano seguinte, 1960, estréia a TV Excelsior. O canal 9 de São Paulo nos seus primeiros anos bagunça todo meio televisivo ao profissionalizá-lo e a inovar com seu modo de fazer televisão. Mas a década de 60 não foi tão boa assim para a TV Excelsior, que viveu cheia de crises até falir em 1970 (ainda por cima tendo seus programas boicotados pelo regime militar, estabelecido em 31 de março de 1964). Numa dessas crises, a que começou em 1965 com a morte de Wallace Simonsen, a emissora foi vendida para o Grupo Saad-Leite e depois estes passaram a mesma para o Grupo Frical (Otávios Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho, donos do Grupo Folha). Mas pouco tempo depois, achando que conseguiria reaver a emissora do pai e ter o sucesso novamente, Wallinho Simonsen compra a TV do Grupo Folha. E é este grupo que constrói os estúdios da Vila Guilherme, na Rua Dona Santa Veloso, que seriam alugados para Wallinho ocupá-lo com a Excelsior. Este é um dos fatores que fazem com que a Excelsior se individe mais até falir.
 
Na retaliação da emissora em 1970, o Grupo Frical que estava totalmente ligado com a Excelsior ainda, começa a exigir parte dos bens que poderia ter direito, por causa das dívidas não pagas. Assim termina contrato de aluguel entre o Frical e os Simonsen, boa parte dos equipamentos da TV Excelsior de São Paulo são arrendados por eles. Os funcionários da Excelsior chegam a levar "tapes" embora, como pagamento das dívidas. Uns como lembrança da TV que mudou a concepção do meio em menos de uma década, outros por saber que as fitas poderiam render bom dinheiro a colecionadores no futuro. E é assim que a Excelsior se desmembra...
 
Naquele mesmo ano de 1970, no aniversário da cidade (25 de janeiro) entrava no ar o tão esperado canal 11. E em 30 de setembro sai do ar a TV Excelsior. Nesta mesma época o Grupo Frical começa a fazer uma parceria com a Fundação Cásper Líbero para a implantação de uma programação de qualidade na TV Gazeta. E é assim que o Grupo Frical, sabendo da competência dos profissionais da Excelsior, da necessidade de estruturar a TV Gazeta e também preocupado com a demissão em massa que poderia abalar o meio televisivo, contrata a maioria dos profissionais do canal 9. Assim que meu tio Luiz Francfort se transportou da Excelsior para a Gazeta, como alguns de seus colegas.
 
No Rio de Janeiro, a emissora faliu no começo daquele ano e pelas mesmas causas do Grupo Frical, a Rede Globo contrata os profissionais da afiliada carioca - por isto muito que se vê na Globo até hoje lembra o tipo de programa que passava na Excelsior (até mesmo as novelas, onde a Excelsior era na boa parte do tempo campeã absoluta em sua época e criadora do gênero diário das telenovelas). Sendo que a emissora global já havia contratado boa parte dos profissionais da Excelsior antes mesmo de sua falência.
 
Mas voltando à Gazeta, o Grupo Frical e a Fundação tinham uma nova estratégia: fazer uma emissora de qualidade, mas que não surgisse para competir pelo primeiro lugar e nem mesmo repetir a história do canal 9 (de ponta a ponta). E foi com os equipamentos da Excelsior que a Gazeta foi montada e planejada. Chegou a receber o apelido de "Canal 20" (11 + 9), por usar os equipamentos da outra emissora, que chegou a considerado ilegal o uso do mesmo. Mas a Gazeta aos poucos foi tendo não só os equipamentos do 9, como comprando outros importados e que na época foi considerada como a que possuía os de melhor qualidade entre as emissoras brasileiras. Alugou diversos equipamentos para as outras emissoras, sendo que uma das primeiras vinhetas do "plim-plim" da Globo foi feita em um dos seus equipamentos novos. Sabiam?
 
Com esta parte da coluna conseguimos entender como foram parar na TV Gazeta os arquivos audiovisuais da TV Excelsior, que só soubemos que estava no canal 11 há menos de dois anos, sendo que a mesma agora os preserva e restaura todas as fitas que restaram do canal 9. Algumas foram para a Globo também, pelo mesmo motivo que algumas foram para Gazeta.
 
Imagem viva
 
Voltemos um pouco a fita... A primeira imagem da TV foi ao ar em 23 de junho de 1969, pois se não colocassem nada no ar, o Governo Federal iria tomar a concessão do canal 11 da Fundação Cásper Líbero. Com apenas um técnico no quadro de funcionários, naquele dia foi ao ar apenas uma imagem áerea da cidade e o prefixo da Gazeta (ZYE- 403-TV). E ao fundo tinha tocando a música "Sá Marina", de  Antônio Adolfo e Tibério Gaspar, composta em 1968. Veja abaixo a letra da mesma:
 
 
Descendo a rua da ladeira
Só quem viu que pode contar
Cheirando a flor de laranjeira
Sá Marina vem pra cantar

De saia branca costumeira
Gira o Sol que parou pra olhar
Com seu jeitinho tão faceira fez
O povo inteiro cantar

Roda pela vida afora
E põe pra fora essa alegria
Dança que amanhece
O dia pra se cantar
Dança que essa gente aflita
Se agita e segue no seu passo
Mostra toda essa poesia no olhar

Deixando os versos na partida
E só cantigas prá se cantar
Naquela tarde de domingo
Fez o povo inteiro cantar
E fez o povo inteiro cantar
E fez o povo inteiro cantar
E fez o povo inteiro cantar
 
Mas estréia oficial da TV Gazeta foi no mês durante a festa do 416º aniversário da cidade de São Paulo, em 25 de janeiro de 1970, tendo como slogan da emissora "imagem viva de São Paulo" e como seu primeiro logotipo um tucano estilizado que formava um "G" totalmente arredondado. Na sua estréia, às 19h, o locutor Honoré Rodrigues narrou as imagens da nave Apolo XI. E pior do que a Tupi, ao invés de apenas uma só câmera pifar na inauguração, pifaram três, transmitindo tudo com apenas uma no estúdio. Já no Edifício Cásper Líbero (prédio "símbolo" da Paulista) da Fundação, que ainda estava em construção e que dava lugar ao casarão, que havia sido demolido.
 
No dia 1º de março daquele ano nascia o primogênito aqui de casa, meu irmão Arthur. O que comprovava mais uma vez que aquele ano estava lotado de "novidades" para a família.
 
Conforme o livro "Almanaque da TV", de Ricardo Xavier, os programas "Informação e Finanças - a Multiplicação do Dinheiro", com Joelmir Betting e "Show de Ensino" foram destaque no primeiro ano de vida da TV Gazeta. Esta emissora, em toda sua história é conhecida por atingir índices elevados de audiência em determinados programas e não em toda sua programa e foram pontos bem dirigidos e elaborados. "Programa Clarisse Amaral", "Mulheres em Desfile", "Mesa Redonda", "Programa Dárcio Campos", "Záccaro - O Italianíssimo", "TV Mix", "Perdidos da Noite"(com Faustão, sendo que este programa nasceu na Gazeta), "Jornal da Gazeta", "Ione", "Clipper" são alguns dos vários pontos que deram e dão audiência a TV Gazeta. Esta que foi a primeira emissora a exibir à cores imagens de São Paulo, pós-primeira transmissão do padrão PAL-M em Caxias do Sul em 1972, considerado como a inauguração oficial da TV à cores no Brasil.
 
E foi nesta emissora que Luiz Francfort mais cresceu profissionalmente, graças a seu esforço e competência, que fez com que chegasse a ser diretor adjunto da rádio e da TV Gazeta, e em certos momentos chegar a responder pela administração da Fundação Cásper Líbero e chefiar missão especial para Argentina, onde representou a TV Gazeta e o nosso Governo Federal para fundar a TV à cores no país vizinho. E ele trabalhou na emissora de 1970 a 1978, regressando à "casa" em 1985. Continuaremos contando a história de Luiz Francfort, que a TV Gazeta considera até hoje como um dos seus filhos. Prova disto esta na carta enviada a Luiz em 1990, quando este era diretor administrativo da Rede Manchete em São Paulo, na época da novela "Pantanal":
 
"Data: 08 de Junho de 1990
 
À TV MANCHETE
Av. Prof.a Ida Kolb, 551
São Paulo - SP
 
Prezado Luiz:

Falando daqui, direto de nossa "filha", TV GAZETA, (esta "garota" de 20 anos que acaba de sair da "adolescência"), fico, de fato, emocionado a me dirigir a você.
 
Agradeço imensamente suas palavras de incentivo. Mas, agradeço, sobretudo, por seu esforço, por seu empenho, luta e dignidade em suas passagens por esta casa.
 
Em meu nome, e em nome de toda televisão, muito obrigado, Luiz, e continue torcendo por nós. Continue de olho nessa TV porque ela também é sua.
 
Sinceramente,
 
Sérgio Felipe dos Santos
 
P.S.: E, concorrência à parte, parabéns por essa grande TV Manchete!"
 
A coluna "Televisão" agora começará a mostrar a vocês partes importantes história da TV Gazeta, que nunca foram contadas nem em livro, nem na Internet... Memórias felizes e de muita garra dos profissionais e da programação do canal 11. Dou destaque à TV Gazeta não só por meu tio ter trabalhado lá, mas também por ser tão esquecida quando falam em história da televisão brasileira. É uma emissora que deveriam ter mais respeito pela sua história. Não deixarei de lado os outros canais, que mais ou menos cronologicamente estamos contando suas histórias.
 
TV Leitor
 
- Meus parabéns às Lojas Marabraz, que trouxeram de volta um jingle de sucesso: o do Banco Nacional (Quero ver você não chorar, não olhar pra trás, nem se arrepender do que faz...), agora cantado por Zezé de Camargo e Luciano, mas também contando com a participação de um coral de crianças como na versão original do jingle.
 
Pessoal, semana que vem estaremos de volta! Um grande abraço a todos! E continuem plugados na coluna "Televisão"! 
 

 
Imagens
tucano Cásper Líbero
O "tucano" - Primeiro logotipo da TV Gazeta. Arquivo pessoal Luiz Francfort (1970). Cásper Líbero - quadro - Acervo Fundação Cásper Líbero. 

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