Televisão
por Elmo Francfort Ankerkrone
Junho 15, 2001
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TV estrangeira do Brasil 

É absurdo dizer que existe uma TV estrangeira do Brasil, ainda mais se estivermos dentro do país e falando dele mesmo. Só que por mais absurdo que pareça, a coluna desta semana explica a vocês como era um país sem as grandes redes de televisão. Um universo onde as televisões de outras cidades -  e as próprias - eram consideradas algo de outro mundo. Cada um defendia a sua bandeira, sem nem ao menos conhecer a bandeira do vizinho. Conheçam o lado "estrangeiro" da televisão no Brasil. 

A 'Era' do Rádio 

Como na televisão muita coisa acaba se repetindo, também faremos isto nesta coluna. Volto a falar da radionovela O Direito de Nascer, que rendeu um fato curioso deste meio. Minha mãe, várias vezes quando falamos desta atual trama do SBT, ela se lembra dos tempos do rádio. Ia ela e a família para Serra Negra (SP) ficar na extinta Pensão Serrana. Certa hora do dia, os hóspedes em geral pediam que os donos do hotel ligassem o rádio na fraquíssima freqüência que vinha do Rio de Janeiro, precisamente a da Rádio Nacional. Assim, sem interrupções de antenas de outras estações pelo caminho, poderia-se ouvir a voz de Paulo Gracindo interpretando Amílton Fernandes. E assim, ouviam a primeira versão de O Direito... . A versão de São Paulo, da Rádio Tupi não teve tanto sucesso como esta da antiga capital federal. 

Nesta mesma época, ainda pela Rádio Nacional e com melhor sintonia, ouviam "O Direito de Nascer" dos radinhos da baixada santista (no caso da família: em Praia Grande). Aliás, não só ouviam as rádios cariocas, como também conseguiam escutar rádios da Argentina e do Uruguai em ondas médias. Incrível, não? Hoje, com o número de rádio-piratas na região e antenas de TV, é impossível se obter esse resultado surpreendente. 

E não era só no caso das radionovelas que o aparelhinho pegava bem, imagine que as "Rainhas do Rádio" de São Paulo tinham difícil penetração no Rio de Janeiro (fato que inicialmente aconteceu com Hebe, que na concepção carioca era uma desconhecida). Enquanto isto Emilinha Borba, Marlene, Linda e Dircinha Batista eram umas desconhecidas em São Paulo. Já Isaura Garcia era aplaudida por todos de nossa terra (à direita, Marlene, uma das "Rainhas" da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, que era "estranha" para os ouvintes paulistanos. Arquivo Folha de S. Paulo). 

Roubando mais uma vez o espaço da coluna do Luiz Fernando Bindi, sobre Futebol, é curioso lembrar que a dificuldade de chegarem na região Centro-Oeste e nas proximidades de Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia o sinal das rádios paulistanas, por terem menor potência do que as do Rio de Janeiro, fazia com que a influência dos times cariocas tomassem conta da região. Por isto, até hoje, se vê um grandioso número de torcedores do Flamengo, Vasco da Gama, Botafogo e Fluminense - muitos que acabaram passando de pai para filho a paixão por estes times.

No canal 4?

As irmãs de meu avô Julio, Luiza e Albertina, moravam no Rio de Janeiro naquelas primeiras décadas de televisão sem redes. E quando viam à São Paulo contavam as novidades que viam pela telinha carioca. Quantas vezes foram as que, pela semelhança dos números de canais, a família trocou as bolas, ficando uma conversa "sem pé, nem cabeça". A confusão só foi pior quando começaram a formar redes pelo Brasil, em determinados horários. A conversa entre minha mãe, minha vó Adelia e minhas tias, ficaria algo assim nesta época (entre as décadas de 50 e 60): 

- Ah, Adelia, você já assistiu o programa do Raul Longras no canal 4? 

- Luiza, não tem nenhum programa do Raul Longras no canal 4. 

- Como não tem? 

- O canal 4 aqui é a Tupi. 

- Tupi? Lá é a Globo. A Tupi é o 6. 

E só depois de um tempo de conversa que se resolviam os problemas. Saiba os canais do eixo Rio-São Paulo que sempre causavam problemas na hora de uma conversa como esta: 

- Canal 2 (SP - TV Cultura / RJ - TV Excelsior) 

- Canal 4 (SP - TV Tupi / RJ - TV Globo). À direita, imagem da televisor, mostrando a vinheta do início de uma rede entre TV Tupi de SP e a do RJ - Década de 50. Acervo da Fundação Assis Chateaubriand (DF).

- Canal 9 (SP -TV Excelsior / RJ - TV Continental) 

- Canal 13 (SP - TV Bandeirantes / RJ - TV Rio)

Atores Estrangeiros 

A TV Continental, uma televisão com pouca vida, mas muito sucesso para os cariocas somente, acabou caindo no esquecimento nacional. Se não fossem as comemorações dos 50 anos de TV por todo o Brasil, falando das antigas televisões que faliram minha família paulistana não saberia da existência deste canal 9 do Rio. Isso só foi descoberto quando Hugo Carvana, ao lado de Jô, deu uma entrevista sobre sua carreira e citou um pouco mais sobre o canal. Senão nem saberíamos que ela existiu antes de se tornar TV Corcovado. Foi tentando descobrir maiores informações que descobrimos que a emissora carioca chegou até a ser a primeira a utilizar o VT (videotape). Isto é muito recente para nós! Podem acreditar! 

As outras TVs até chegavam aqui mais ou por serem afiliadas das de São Paulo ou por comprarem programas gravados das emissoras daqui, passarem no Rio e depois serem comentados conosco. É o caso da TV Rio, irmã da TV Record, das duas Tupis e das duas Excelsior. Já nessa época, a Continental tinha ligação com a TV Paulista, sendo que ambas logos faliram e a Paulista tornou-se Globo, só podendo se ligar com a homônima carioca. 

E vocês acham que isto é algo antigo? Saiba que a Gazeta, em diversos lugares do Brasil ainda não é conhecida, o mesmo que acontece com a CNT. A idéia de uni-las foi também para divulgar a imagem das duas emissoras pelo Brasil. Duas mini-redes, perto das outras que em cada ponto do Brasil tem seus sinais. E isso não é tão longíncuo: no Rio de Janeiro e em Curitiba não há a Gazeta, enquanto a CNT em São Paulo se desdobra para chegar aqui. A TVE e a Cultura, antes da RPTV (Rede Pública de Televisão) eram televisões educativas totalmente regionais. 

Sobre os atores de emissoras de outros estados, naquela época, chegavam em São Paulo e não ganhavam o mesmo prestígio do que em suas regiões. Um que teve que se desdobrar até crescer na profissão e se revelar para a televisão em rede foi o humorista Renato Aragão, vulgo Didi Mocó! Este que foi um dos grandes astros do humor da TV Ceará, pertencente às Emissoras Associadas. Didi só teve uma projeção nacional quando chegou na Excelsior, uma emissora que começava a misturar melhor os núcleos de suas afiliadas com as da cabeça de rede. 

Chico Anysio, Fregolente, Carequinha, Aidée Miranda, Raul Longras e tantos outros eram estrangeiros em São Paulo. O próprio Chacrinha era exemplo do estrangeirismo. Quando falo de algum ator antigo para minha mãe e ela não sabe, a mesma brinca dizendo: 

" - Ah, este é estrangeiro do Rio."

Mas muitos caíram no gosto dos paulistanos e entraram depois para nossa história, como o caso de Yoná Magalhães e Heloísa Helena, ambas da TV Tupi carioca; Emiliano Queiroz, da TV Ceará; Henrique Martins (o eterno "Sheik de Agadir"), da TV Globo carioca; e Cid Moreira, da TV Rio. 

Na TV Itacolomi o problema não era tão drástico assim, pois a Tupi paulistana ordenou que muitos de seus atores trabalhassem lá por um tempo, integrando o núcleo da Itacolomi. Entre eles Amílton Fernandes, entre outros. 

É por causa deste eixo Rio-São Paulo que pouco sabemos do futuro dos Diários Associados, pós-falência da Rede Tupi. Aliás, os Associados se fortaleceram e muito, sendo dono de vários provedores de Internet, entre eles o Uai, de boa parte da Rádio Nativa na região fluminense, donos de grandes rádios e jornais, como o Correio Braziliense, sem esquecer das ascensão de suas TVs, que só são retransmissoras hoje (como no caso da TV Alterosa, TV Goiânia, TV Minas Sul, TV Brasília, entre outras). É uma grande potência que não nos damos conta que existe. 

Uma viagem inesquecível 

De férias da loja "Casa da Raposa", comandada por meu bisavô Antonio Moreira de Freitas, minha mãe Alzira e meu tio Luiz Francfort foram atrás de conhecidos da televisão, mesmo estando ele afastado por um tempo do meio, e foram pedir recomendações para visitar as televisões do nordeste do país, mesmo passando na volta por outras regiões. 

A aventura compreendeu em 14 vôos, em mais ou menos um mês, partindo de São Paulo no início de julho de 1961. Passaram por muitas cidades do Brasil, sendo mais ou menos este o mapa da viagem (falta uma viagem de avião, que não recordamos qual): 

São Paulo -Rio de Janeiro (RJ, direto do Galeão)

Rio de Janeiro - Salvador (BA)

Salvador - Campina Grande (BA)

Campina Grande - Recife (PE)

Recife - Fortaleza (CE)

Fortaleza - Natal (RN)

Natal - São Luiz (MA)

São Luiz - Belém (PA)

Belém - Santarém (PA)

Santarém - Manaus (AM)

Manaus - Brasília

Brasília - Rio de Janeiro

Rio de Janeiro - São Paulo

E no meio desta história os dois irmãos conheceram várias televisões da época: 

- Primeiro a TV Itapoan, canal 5 de Salvador (Emissora Associada) - que tinha como símbolo o indiozinho da Tupi (à direita,  Logotipo inicial da TV Itapoan - Divulgação TV Itapoan - Histórico / Rede Record);

- A TV Jornal do Comércio, canal 2 do Recife (uma emissora muito bem cuidada, com equipamentos modernos demais para as TVs da região na época, tudo tratado à "pão-de-ló" - pertencente a um grupo privado, cujo nome era Pessoa de Queiroz); 

- A TV Ceará, canal 2 de Fortaleza (Emissoras Associada) - que como em São Paulo possuía o "Circo Bombril", cujo espaço do picadeiro montado no estúdio era de aproximadamente 6 x 6 m, com uma arquibancada de madeira em toda sua volta. 

Foi uma aventura que valeu a pena. Os dois conheceram televisões que não imaginavam como elas seriam, em regiões que não possuem condições como as de São Paulo e o Rio de Janeiro na época. Foram felizardos em conhecer uma televisão com a cara de cada povo, não possuindo uma programação só para todo o Brasil. O que seria do Brasil hoje sem redes de televisão? 

TV Leitor 

-* Esta semana recebi uma mensagem de um profissional que era meu principal objetivo atingir com o artigo "Hoje tem marmelada?": um palhaço. Davi de Souza, que com muito orgulho dá vida ao palhaço Cacareco no Rio Grande do Sul, disse estar feliz com o artigo, por resgatar as memórias circenses do Brasil, que não poderiam mesmo se apagar. Ele estuda sobre a história destes amigos da criançada e pede, não só para eu, dicas sobre livros e documentos sobre a história circense. E eu logo passarei a você, Davi, através de seu e-mail o nome de dois livros que falam deste fantástico universo. Agradeço pelos parabéns e torço pelo crescimento do seu grupo de teatro circense, aí dos pampas! 

- A jornalista Sabrina Silva, da capital do Rio de Janeiro, pede ajuda para sua monografia sobre programas infantis na televisão brasileira. Se algum leitor possuir informações, favor me passar, pois estarei repassando para a mesma no exato momento que aqui elas chegarem. Vale a pena relatos sobre programas, desenhos, tudo que lembrarem é importante à Sabrina. Ou senão escrevam para elmo@televisaobrasil.cjb.net 

- O leitor Wellington expressa sua opinião sobre meu artigo "Folia na Telinha", dizendo: "Adorei este artigo, reflete bem o que está acontecendo com o carnaval brasileiro, o monopólio que a Globo está exercendo sobre o Carnaval." Infelizmente isso é verdade. Só que não se deve somente ao carnaval. A perda do monopólio global só seria bom pela melhoria dos canais, devido a concorrência pelo primeiro lugar, ao invés de lutarem sempre pelo segundo. O SBT é prova disso, com um de seus antigos slogans: "o vice-líder na preferência nacional". 

E ficamos por aqui, pessoal. Semana que vem as donas de casa deixem-se seus almoços prontos, porque na sexta-feira que vem a hora do almoço vai ser aqui. Curiosas para saberem? E o resto da família também? Então até sexta-feira que vem! Aguardem a nossa próxima atração! 

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