Televisão
por Elmo Francfort Ankerkrone
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A inauguração de Brasília 

Para a televisão e para o país a inauguração de Brasília foi um marco de nossa história. O avanço da tecnologia e a mudança de mentalidade fez com que aquele ano de 1960 fosse muito especial. (À direita, foto tirada à partir de video-tape da fundação de Brasília, mostrando a fachada do Palácio da Alvorada (21/04/1960). Sob os cuidados do CEDOC-Rede Globo. Não sabemos a procedência do VT.)

Imagine colocar na cabeça dos cariocas, principalmente, que o glamour de ser a capital brasileira estava passando para um matagal, sem história nem nada... Sem história mesmo! Pensem que pelo lado do Rio de Janeiro a vida de capital durou 2 séculos quase! E Brasília? Não...Brasília era apenas um terreno que geograficamente ficava no meio do país... Meu Deus! Isso era grave...Não é a toa que muita gente relutou até aceitar a idéia de Juscelino Kubitschek... Este, que conquistava o apoio do povo com seu ideal de fazer com que o Brasil crescesse rapidamente. Brasília era apenas o símbolo de sua conquista... Enquanto isso, no Rio de Janeiro, os cariocas não aceitavam que chamassem o Rio simplesmente como Estado da Guanabara, já que o Rio ao deixar de ser capital seria englobado por este... E assim, a cidade que ouvia todos dizerem que Brasília era a "novacap" (nova capital), ela dizia que era a "velhacap", mas sempre capital! 

Juscelino voltou-se para idéia de Tiradentes e dos inconfidentes mineiros, de José Bonifácio, de D. Pedro I e D. Pedro II...Todos a favor de colocar a capital no centro geográfico do país (apesar que muita gente diz que Brasília não é o verdadeiro centro, que seriam cidades vizinhas dali). E a idéia era justamente homenagear os inconfidentes mineiros (mineiros como o presidente JK!) fundando a cidade no dia da morte do alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes: 21 de abril. 

E pela mãos de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer Brasília saiu do papel...Uma cidade planejada em formato de avião. Com bairros renomeados de "asas" (asa norte, asa sul, ...). E Juscelino assim concretizava parte do seu sonho, sob o slogan de seu governo populista e progressista: "50 anos em 5". 

Primeira formação de rede 

A inauguração de Brasília foi responsável pela primeira grande formação de rede, com links e tudo que tinha direito... Não era uma corrida espacial, mas todos queriam um cantinho naquele grande evento! 

E naquele dia as Emissoras Associadas (da TV Tupi, TV Itacolomi, ...) e as Emissoras Unidas (TV Record, TV Rio, ...) brigavam novamente entre si. E sem esquecer que o Governo Federal mal tinha fundado a sua nova "base de comando" e entrava na briga pelas concessões de Brasília... Assim, no mesmo dia, quase na mesma hora, três televisões entraram no ar... Foi algo incrível, nunca aconteceu algo igual na história da televisão mundial. E assim os Associados abriam a TV Brasília (canal 7) , as Unidas com a TV Alvorada (canal 8) e o governo com a TV Nacional (canal 3). 

A posse de Juscelino Kubitschek foi a primeira de um presidente brasileiro televisionada regionalmente e em rede nacional. 

Esta inauguração marcou também a estréia do video-tape (VT) para todo o país. 

As Emissoras Unidas, representadas pela TV Alvorada (um pequeno apartamento, na verdade) de Brasília recebeu da TV Rio um caminhão de externas e um aparelho de VT. E assim um link entre a TV Alvorada e o Palácio do Planalto foi o primeiro passo para a cobertura das Unidas naquele dia. As fitas de VT iam para o Rio de Janeiro em seguida, foram três vôos para a antiga capital. E do Aeroporto Santos Dumont seguia para a TV Rio que reabria seu link intermunicipal novamente, unindo-se com a nossa TV Record. 

Os Associados fizeram uma loucura maior ainda... Foram o "primeiro grande link", considerada a primeira formação de rede de nossa televisão. Eles gravavam tudo no Palácio do Planalto, depois "linkavam" para a TV Brasília, que mandava o sinal para um avião que repassava para um segundo avião (ambos com microondas e parábolas instaladas)... E uma antena receptora recebia o sinal no meio do caminho, mandando para TV Itacolomi de Belo Horizonte, que agora só por terra passava o sinal para outra antena, que gerava para a TV Tupi do Rio de Janeiro, repassando este sinal para outra antena na Serra do Mar que mandava o sinal para a TV Tupi de São Paulo...Ufaaa... Assim Brasília se conectava a São Paulo através desta primeira rede de links televisivos... Mas por causa da distância, dos aviões e de outros problemas (como até um pouco de falta de tecnologia) as imagens chegavam distorcidas, interrompidas violentamente, tremulavam e tanto somo comos chuviscos danificavam a transmissão... Mas à noite também chegavam à São Paulo um VT com as imagens (bem mais perfeitas...) da inauguração de Brasília. 

Quem não leu minha coluna TV Ano 60, eu lembro aqui que a TV Brasília é a única das emissoras da Rede Tupi que não faliu e que continua viva até hoje e nas mãos dos Diários Associados desde de sua fundação. 

Assista aqui a partes de video-tape dos Associados que transmitiu a inauguração de Brasília pela TV Tupi aqui em São Paulo (só é possível assisti-lo se possuir o Real Player ou o Real Áudio, por estar no formato RAM). 

Uma curiosa cobertura 

Como já disse na semana passada, meu tio Luiz Francfort estava em Curitiba no primeiro semestre de 1960, servindo de diretor de TV da Emissora Paranaense, canal 12 de Curitiba. 

No dia em que iria ser inaugurada a nova capital federal, se dirigindo à emissora de manhã, chegou um convite do governador do Paraná, Moisés Lupion (antigo proprietário do Palácio Lupion, hoje sede da TV Paranaense), para que a equipe da única televisão da região cobrisse sua participação nos eventos de Brasília. Eram só dois lugares no avião. Renato Mazanek perguntou até para minha mãe e minha vó, que também estavam em Curitiba, se caso ele arranjasse mais lugares no avião, se as duas gostariam de ir... Elas aceitaram na hora, independente do que poderiam enfrentar. Ver a inauguração de Brasília era um sonho brasileiro na época... Mas Renato não conseguiu os lugares para inauguração da "capital do futuro". 

O jeito foi o de só Luiz e Mazanek irem para Brasília. Tiveram o tempo de avisar em casa que estavam indo e embarcaram logo em seguida, sem dar tempo de trocar de roupa, nem de escovar os dentes... 

Só que a Emissora Paranaense foi tão às pressas para Curitiba, que nem equipamento levaram! Renato tinha um endereço em Taguatinga (perto de Brasília) de um senhor que tinha câmera. O pior é que durante a viagem o governador notou a falta de equipamento, mas Mazanek explicou que estava tudo acertado e que iriam pegar o equipamento em Brasília.

Decolaram de Curitiba com um antigo avião Douglas DC-3 de 40 lugares. E Luiz comenta: "Quando chegamos a nova capital, nunca vi antes um tráfego aéreo como aquele. Ao nosso redor tinha aviões militares e vários aviões de presidentes e reis, aguardando ordem de pouso." Quando conseguiram pousar, o comandante soube que a comitiva de carros para o Governador Lupion estava em outro setor. E saíram por um portão, entraram numa larga avenida e junto com os outros carros, foram ao local que os esperavam. Meu tio até completa, brincando: "Nunca pensei em andar de avião em avenidas!"

E os dois correram à Taguatinga, onde ruas de terra vermelha, com um ar velho oeste americano poderiam ser consideradas cartões-postais da cidade. Procuraram pelo senhor da câmera, perguntaram para todos, mas nada de achá-lo. Foi-se a possibilidade de cobertura jornalística da presença de Moisés Lupion na inauguração de Brasília.

Era muita gente dentro de Brasília. Meu avô Julio Francfort havia ido para lá também, representando a Construtora Macife de São Paulo, que forneceu material para construção da capital. Ele e o filho nem conseguiram se esbarrar por lá... Era impossível, só com muita sorte para encontrar alguém conhecido.

E foi uma bagunça geral... À noite os dois ficaram sem alojamento. E aí um diretor da Rádio Nacional sugeriu que pegassem os bancos da calçada da Avenida W-3 e dormissem neles. E foi naquele mesmo lugar onde dormiram que um dia seria o auditório desta rádio. Não pensaram duas vezes e fizeram isto.

No dia seguinte, por puro coleguismo profissional, mas alguém se preocupou com Luiz e Renato: uma jornalista de Curitiba que também havia viajado com os dois no avião, ficou com pena, e reclamou ao serviço encarregado de atender a Imprensa. E assim conseguiram um apartamento lotado, com camas... Mas só havia uma, de solteiro para os dois. E Luiz Francfort lembra: "O Renato ficou com ela e eu com o cobertor e travesseiro no chão! Foi como um hotel 5 estrelas, para quem tinha acordado, "listrado" pelas ripas do banco!"

E nas palavras do mesmo completo o resultado daquele dia: "Foi uma das mais importantes "coberturas" que participei, mas, que jamais foi feita ! Ao menos, estive nas comemorações, ganhei um aperto de mão de Juscelino Kubitscheck, e posso contar para meus netos que estive na inauguração de Brasília!"

Já sobre o caso da cobertura televisiva proposta por Renato Mazanek à Lupion... Esta só o mesmo sabe, mas deve ter sido muito chato contar que eles acabaram "profissionalmente" indo à passeio.

Aconteceu, virou Manchete

Não há como não citar isso... É algo que impressiona até hoje. O respeito que até os parentes de Adolpho Bloch, que nem conheceram Juscelino Kubitschek tem por ele. Impossível de falar de Juscelino sem citar o "Seu Adolpho", proprietário da Bloch Editores. A união dos Kubitschek com os Bloch era muito grande, até a morte de Sara Kubitschek (mulher de JK), ela e Adolpho se visitam freqüentemente. Muitas vezes ela foi até o grande edifício da Manchete na Rua do Russel, onde se encontrava até o gabinete presidencial de Juscelino em Brasília - que foi doado à Bloch depois que acabou seu mandato. Gabinete que nem sei onde hoje se encontra, já que os bens do grupo estavam sendo leiloados após a falência da emissora e das revistas - que agora circulavam sem uma freqüência certa e sob olhares judiciais. À direita, foto de Adolpho Bloch em frente ao Memorial JK - Brasília (1993). Revista Manchete - Arquivo Bloch Editores.

Adolpho Bloch batia muitos papos com Juscelino e passeavam pelas praias e ruas do Rio de Janeiro, levando consigo a sua fiel companheira "Manchetinha" (uma cachorra dálmata). Quando Kubitschek morreu, Bloch fez questão de que os políticos de Brasília fizessem lá o "Memorial JK", onde estão os restos do ex-presidente. 

Muitos dizem que foi por causa de Juscelino que a Revista Manchete cresceu muito naquelas décadas, tirando todo público de "O Cruzeiro", dos Diários Associados, e só sendo depois superada pela Revista Veja, do Grupo Abril. Pode até ter sido as influências com o presidente que fizeram os Bloch progredirem, sendo que a cobertura jornalística da inauguração de Brasília foi de alta qualidade pela Manchete. Mas não podemos dizer que ele explorava, por puro interesse, a amizade com JK. Os dois acima de tudo eram os melhores amigos. 

Quando a Rede Tupi faliu e parte dela virou a Rede Manchete, Bloch fez de tudo para ficar com a emissora da capital federal, a TV Brasília. E fez questão de valorizar não só sua emissora do Rio de Janeiro (a "cabeça de rede"), como a de São Paulo e a de Brasília, que não era costume tê-la como uma das principais... De lá Carlos Chagas fazia sua reportagens para a Rede Manchete. 

Até a morte de Adolpho Bloch, quando ele escrevia editoriais para a sua Revista Manchete trazia no cabeçalho sempre seu nome e ao lado a foto dele abraçando pelos ombros Juscelino Kubitschek. E todos números especiais e comemorativos da revista tinha sempre uma parte dedicada à história de Juscelino. Por mais repetidas que fossem essas matérias, nenhum funcionário tinha coragem de contestar a decisão de Adolpho, pois todos sabiam do carinho e da saudade que ligavam a Manchete à Juscelino. 

E encerramos esta coluna com a música símbolo do governo JK, o eterno mineiro que construiu Brasília:

"Como pode Um peixe vivo,
Viver fora d'água fria?
(BIS)
Como poderei viver?
(BIS)
Sem a tua, sem a tua,  
Sem a tua Companhia?
(BIS)"

TV Leitor 

- Oi pessoal! Eu aqui de novo! Gostaria de agradecer aos amigos e os leitores curitibanos que leram a minha matéria da semana passada, sobre a TV Paranaense. Obrigado pelos comentários, pessoal! 

- Ao "comportado" colega do Sampa On Line e leitor João Antonio Wiegerinck espero que esta coluna tenha aumentado seus conhecimentos sobre os anos que antecederam seu nascimento. Já que após ler a coluna "Palmeiras Televisivas", você chegou a comentar que nasceu "... no mesmo ano da Globo, e não tinha idéia de alguns dados que você nos trouxe." Abraços do colega "televisivo"! 

- O leitor Leandro Tavares Guimarães pergunta se existe mesmo um memorial televisivo dentro do CDT do SBT, no Km 19 da Rodovia Anhangüera e se é aberto ao público. Infelizmente esse dado não sei. Caso eu possua leitores que trabalham na área (e que saibam dessa informação) ou até mesmo profissionais do SBT gostaria de mais detalhes sobre este memorial. Agradeço em nome do Leandro...e em meu nome também, é claro! 

- Ao colega-leitor Luiz Fernando Bindi, informo que acho genial a idéia de falar dos heróis japoneses...Desde Ultraman até Pokemon... Estou ainda escolhendo se farei uma coluna sobre enlatados ou sobre heróis japoneses especificamente. É, pessoal. Dêem suas opiniões...Qual das duas formas vocês acham que devo fazer a minha coluna sobre o assunto? "Agora, vocês decidem..." (Não posso gesticular  como a Suzana Werner, senão semana que vem eu vou dizer que a "Gata Comeu" minha coluna...) 

- Vamos dar pulinhos, criançada! Achei finalmente o nome daquele livro sobre o circo no Brasil que dois leitores já haviam me pedido... Aí está "O Circo no Brasil", da Funarte - lançado em 1998, é o quinto voluma da série "História Visual". É muito completo e possui até um CD junto com músicas e relatos para todos se divertirem. Na capa vocês encontraram a foto do palhaço Torresmo, da dupla Torresmo e Fuzarca - os primeiros palhaços da TV brasileira! Boa sorte com suas pesquisas e trabalhos, Marina Cardozo e Davi de Souza (o sulino palhaço Cacareco)! 

- Um forte abraço! E semana que vem tem mais! E em clima nostálgico, finalizo esta coluna "Tchau, tchau, tchau... Eu vou viajar...Tchau, tchau, tchau...Mas eu volto já..." (Papai Papudo). Até nossa próxima atração, pessoal!  

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