Moradoras recordam época da Chácara Itaim e do matagal Vila Olímpia
Por Joyce Ribeiro
Dezembro 13, 2004

A região dos bairros Itaim Bibi e Vila Olímpia, hoje repleta de edifícios, bares e estabelecimentos comerciais, já foi uma tranqüila área de chácaras povoadas por imigrantes e descendentes de italianos e portugueses.

Sarah Realti, 75 anos, que há 38 anos reside no mesmo local da Vila Olímpia, relembra com saudades do tempo em que chegou à rua Ministro Jesuíno Cardoso: "Aqui era tão tranqüilo. À noite, dava até para ouvir o som de sapos e grilos".

Sandra Regina Santo Ambrósio, 49 anos, pertence à família italiana Tronchin, que chegou há 80 anos à Vila Olímpia para trabalhar como caseiros de uma família abastada, os Pansardi, afirma: "A história da minha família se confunde com a da região".

O Itaim, chamado antigamente de Chácara Itaim, nasceu na Avenida Santo Amaro, onde hoje é a confluência da Av. Pres. Juscelino Kubitschek com a Av. Antônio Joaquim de Moura Andrade. Neste local ficavam as chácaras dos pioneiros italianos, que sobreviviam do plantio de verduras e legumes para o abastecimento local, do cultivo de flores e da criação de animais. Sandra lembra de senhoras portuguesas, com trajes pretos, segurando flores e vendendo-as nas ruas. Já a Vila Olímpia era um charco, um verdadeiro matagal de terra preta, o que dificultava as construções. Com ruas de terra batida, os meios de transporte utilizados eram as carroças e as charretes. Dona Sarah recorda de uma espécie de ônibus, chamado jardineira, que descia toda a Rua Augusta em direção à Vila Olímpia: "Quando menina, eu vinha para as chácaras pegar mexerica, goiaba e jabuticaba".

A igreja Santa Tereza de Jesus, a mais antiga do bairro, está presente na história de boa parte dos moradores, seja nos batismos seja nos casamentos. Há cerca de 20 anos, ela realiza a tradicional Festa dos Povos num fim de semana do mês de outubro. Não havia áreas específicas de lazer na região. Havia um projeto do que seria chamado "Nosso Clube do Itaim", mas que não se concretizou. Os homens costumavam freqüentar o Clube da Bocha, ainda hoje muito tradicional no bairro. Restava portanto aos moradores fazer piqueniques e visitar o Parque do Ibirapuera. A pesca no Rio Pinheiros era uma outra forma de diversão: "Acredite, já comi peixes deste rio", afirma dona Sarah. O Córrego do Sapateiro, em épocas de chuvas fortes, inundava as casas, para desespero das famílias, e os alunos do colégio Costa Manso sofriam para atravessá-lo. A canalização do córrego modificou a Av Dr. Eduardo de Souza Aranha, onde hoje é Av. Pres. Juscelino Kubitschek.

O bairro sempre contou com escolas estaduais de primeira qualidade, como o Colégio Martim Francisco, Aristides de Castro e o Costa Manso. "Os estudantes precisavam fazer um vestibulinho para conseguir uma vaga", conta Sandra. Havia ainda, na Av. Juscelino Kubitschek, a Escola Estadual de Formação de Professores Ceciliano José Ennes, hoje localizada na rua Cojuba.

Na esquina da rua Joaquim Floriano com a Bandeira Paulista ficava a fábrica da Kopenhagen, responsável por dar ao bairro do Itaim o cheiro adocicado de seus chocolates. Anos antes, este local havia sido um ranking de patinação. A mãe de Sandra lhe contou que, cerca de setenta anos atrás, havia festas de carnaval com desfiles de charretes nestas ruas. As compras eram feitas nas quitandas e armazéns, onde as famílias tinham cadernetas e só pagavam as despesas no fim do mês. Todas quartas e sábados, a feira livre, que ocupava a rua Tabapuã inteira, era visitada por moradores à procura de galinhas vivas e de alimentos frescos. A família
Strano, tradicional no bairro do Itaim, tinha uma barraca de verduras. Hoje, a feira está confinada no Parque do Povo.

Os estabelecimentos comerciais, conhecidos pelos nomes de seus proprietários, estavam localizados na rua Joaquim Floriano e atendiam às necessidades da população local. Havia a loja de tecidos do Seu Abraão e a do Seu Moisés, a loja de calçados do Seu José, o bazar de material escolar do Betinho, a padaria Alasca, famosa por seus pães, e Desirée Armarinhos, ainda existente. O Mappin ficava no local onde hoje é o Hipermercado Extra.

Na década de 60, a Caixa Econômica Federal financiou casas padronizadas na região, criando pequenas vilas. Mas a feição de bairro residencial começou a mudar já na década de 70, quando a rua João Cachoeira passou a ser o que tinha sido a Rua Augusta nos anos 60, isto é, uma área de intenso comércio. A primeira grande loja foi a Franita. Até então o comércio localizava-se na Av. Santo Amaro, onde ficavam os cines Vila Rica, Del Rey e Graúna.

Na década de 90, a região sofreu uma grande transformação com o prolongamento da Av. Brigadeiro Faria Lima, responsável por dividir  o bairro ao meio. Dona Sarah lembra emocionada da desapropriação de uma antiga vila de moradores da rua Cassiano Ricardo em 1993/94: "Lutamos muito para que o bairro se mantivesse tranqüilo como quando cheguei aqui". Hoje, com sua casa rodeada de bares e danceterias que desrespeitam impunemente a lei do silêncio, viu sua saúde seriamente afetada, e completa: "Estou muito triste: vou deixar o bairro em que criei meus filhos em nome da minha saúde".

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